quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Erosão

substantivo feminino - processo ou resultado de desgastar(-se) lentamente; corrosão.

De uns tempos pra cá virou hábito, e crescente. Em certos momentos, sem premissa, recordo em segundos algumas vivências aleatórias da trajetória de Recolon. Só que na memória as recordações não se organizam em anos ou fatos, são desobedientes à ordem cronológica, apenas borbulham, sem regras. São lembranças contingentes que transitam entre fotografias, sons, odores, textura e outros corpos. Colou-se à minha memória alguns relatos de desaparecimento de familiares, trazidos em assembleias organizacionais / da plantação de Seu Raimundo / do mercado Adolpho Lisboa / de debates que insistiram no tempo / do reencontro com meu melhor amigo em Floripa / do que ouvi sobre a cheia em Nazaré / do cheiro da macaxeira que entranha a terra / do sentimento atônito ao assistir o solo Entre Terras / do espantoso número de gados na beira da estrada de terra em Rondônia / de quando vi a praça da Estrada de Ferro submersa em água e lama / da tinta que persiste em ficar debaixo das unhas / da foto achada no porão do meu tio Ivan colhendo macaxeira em Nova Olinda do Norte / do meu pai falando que não vai dar mais pra trabalhar pois a BR estava comprometida em águas. As lembranças estancam e passam a impregnar minha margem, e a água que bate leva. Leva pra longe, ecoam em outras corredeiras, se diluem em outras vazantes, desaguam. 

A temporada de Recolon em Manaus virou memória. As apresentações aconteceram aos sábados e domingos de Setembro, no Espaço Artrupe. O local (av. Joaquim Nabuco, 1436, Centro) é uma dessas casas antigas do centro histórico de Manaus, e atualmente é gerido pela produtora de mesmo nome. Por épocas passadas ocorreu no mesmo espaço, quando intitulado Lugar Uma de Artes, a primeira edição da residência Jovens Criadores no Amazonas, nesse momento Recolon era um embrião, que recebeu dos artistas mediadores impulsos para a desenvoltura do solo. Imensamente grato à Thelma Bonavita, Chris Lauenbergue e Francisco Rider. 

A performance ocorria em um porão, e o debate era feito numa varanda de quintal, me foram trazidas reflexões, leituras e contextualizações de outras geografias, como a situação ocorrida no município de Balbina, Amazonas, que também sofreu os impactos gerados pela construção de uma usina hidrelétrica. Essa similaridade entre a temática foi bastante evidenciada, desde os ensaios abertos realizados em Manaus.

Outras temáticas, mais distantes, me foram trazidas durante a série de debates, como a do fluxo migratório, abordado por um casal de venezuelanos, a condição negra no Brasil, e do consumismo no sistema capitalista. Recolon se efetiva quando complementa uma ótica de mundo particular, considerando as referências de quem o assiste para a fruição e leitura da obra. 

Uma mostra do processo foi realizada na Mostra Universitária do Festival Mova-se, que aconteceu no começo do mês (02), no Teatro da Instalação. 



10/09/2016




Fotos de César Nogueira



11/09/2016





Fotos de César Nogueira




17/09/2016














Fotos de JP Machado



18/09/2016







Fotos João Paulo Machado




24/09/2016










Fotos de Juliana Rosa Pereira



25/09/2016














Fotos de João Paulo Machado


http://g1.globo.com/am/amazonas/amazonas-tv/videos/t/edicoes/v/no-am-espetaculo-alerta-para-impactos-de-hidreletricas/5300043/


Este projeto foi contemplado pelo Prêmio Funarte de Dança Klauss Vianna 2014.